sábado, 9 de janeiro de 2010

Apanhada nas Palavras

Andava aqui eu à volta dos regimes de propriedade medieval: Honras, Coutos, Alódios e Reguengos - que sempre vou relacionando com actuais nomes de terras - quando leio a seguinte descrição:
"O couto – do latim «cautum», que significa «segurança» - era um privilégio outorgado a um território ou a um simples local, que assim ficava excluído da jurisdição régia. O «marco de couto», ou «lugar de couto», tanto podia ser uma casa ou uma simples porta, um acidente do terreno ou um curso de água, etc., que o fugitivo devia alcançar para se encontrar ao abrigo da justiça do rei." (Cocheril, Dom Maur, Alcobaça, Abadia Cisterciense de Portugal, p. 27)
E lembrei-me do jogo da apanhada. Lembram-se? Havia um lugar que era salvo, onde não nos podiam apanhar, quando lá chegávamos gritávamos: Coito!
Era demasiado semelhante para não ter uma relação! E lá fui eu à procura dela:
"Todos os outros jogadores terão de fugir do «apanhador», dentro de um determinado recinto, existindo no entanto um local previamente determinado, designado por «coito», dentro do qual os jogadores não podem ser apanhados."(Pereira, Patrícia, Brincar com Tradições, p. 26, Município de São Bras de Alportel)
A condição de alcançar um determinado local e ficar a salvo era mesmo demasiado similar para não ter a mesma origem. Continuando...
No dicionário online priberam, lá estava esclarecido que "Coito" pode ter como significado "o mesmo que couto", que "Couto" significa "Asilo, Refúgio" e que "Acoitar" é uma palavra antiga, que significa "dar couto ou guarida"
Pessoalmente, lembro-me desta última como sentido de esconder, de dar cobertura a algo de ilegal, de cumplicidade...o que também não está fora do contexto.
E pronto: foi uma viagem interessante de ligações entre palavras, esquecidas, estudadas, brincadas e nunca dantes pensadas. Mas, como sempre, uma viagem fascinante de descoberta entre as palavras, a sua evolução, os seus significados. E, além do mais,inesperada: Uma pausa para brincar...à apanhada das palavras!

4 comentários:

josé luís disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
josé luís disse...

[o primeiro comentário ficou "em branco", tentemos de novo...]

escrivaninha,

obrigado por me recordar a apanhada e o "coito" seguro...

(ai, a língua traiçoeira é tão portuguesa!...)

Escrivaninha disse...

Eu sabia que o tema dava azo a trocadilhos...:-)

Ninguém.pt disse...

Prontas a deixarem-se apanhar, modelar, retorcer, reutilizar, morder e amar...

Às vezes vêm de muito longe:
de fatigadas viagens,
de mortes prematuras,
de excessivas solidões.
Mas vêm.
E trazem a inicial pureza das fontes.
E a lâmina do silêncio.
E a desordem da noite.
E a luz extenuada do olhar.
Tão cúmplices, as palavras.


Graça Pires